sexta-feira, 3 de outubro de 2014

MORADIA DE PENSÃO


Chove agora em São Bento do Sul-SC. A temperatura cai, 10 graus, tarde de quarta-feira, 15 horas, mês de abril. Na rádio, toca Blues dos anos sessenta. Ia sentindo saudades, quando me lembrei da famigerada vida de Pensão naquele tempo, em Recife. Quem estiver planejando sair de casa, separar-se conjugalmente, mire um apartamento ou uma casa, pois vida de Pensão é muito triste. Tão triste que estimula suicídios.
Lembro-me, saindo do bairro paradisíaco, Várzea, cheio de alegrias, brincadeiras e liberdade, deparei-me com uma Pensão. Agora, não poderia mais cantar, pois incomoda os outros. Nem fazer serenatas, já que não há casas com mocinhas que acendiam as luzes do quarto, avisando que estavam ouvindo. Não podia cantar no banheiro, visto que significava demora de banho, gasto com água. Então, pode-se ler um livro? Não. Isto consome energia elétrica; os quartos são sempre escuros e não pode demorar com a luz acesa. E ouvir rádio? Não há rádio nos quartos, nem pode ligá-los, incomoda. Então, nem cantar, nem ouvir músicas. Ah! Vou descer à rua! E aí, não há terra, matos, flores, bola de futebol e de voleibol, festa em casas de vizinhos, fruta no pé, serestas de rua, um cavaquinho tocado num boteco!
Meu Deus! Volto então ao quarto. Um silêncio fúnebre! Um quarto feio e infecto.  De vez em quando um rato passa rápido. Mas até ele às vezes é útil. O susto distraiu-me da ideia de suicídio, e na parede uma barata; nos corredores, as vozes do (da) proprietário (a) da Pensão, sempre reclamando algo, fazendo alguma ameaça, como se fosse carcereiro de uma penitenciária!
A revolta embaça a ideia de suicídio. Levanto-me, troco de roupa, um pouquinho de dinheiro no bolso leva-me então ao baixo meretrício. Lá bebo uma cachaça com abacaxi, encontro um conhecido que me paga uma cerveja, negocio com uma prostituta uns minutinhos de sexo por pouco dinheiro. Quando não consigo, volto à Pensão com vontade de morrer! Quando consigo, e olho a mulher, expulsando-me do quarto com gestos, e sinto pena e nojo dela, sinto também pena de mim, e um pouco de nojo por entrar no corpo de uma mulher de todo mundo. Volto à Pensão, com vontade de morrer! Um banho, porém, me distrai. Após o banho, já está amanhecendo. Com fome, aguardo o café com pão da manhã. A dona da Pensão já está gritando! Que sina esta minha! Adoro mulher, detesto mulher gritando! (a não ser em momentos sexuais). Minha mãe gritava o tempo todo, as donas das pensões que morei gritavam o tempo todo!
Quando é que o ser humano vai se aperfeiçoar como animal Sui Gêneris!?
O mundo prosperou materialmente de forma gigantesca, não se pode negar. Mas o homem, “cospe” na sua beleza interna e se emporca-lha cada vez mais nas pútridas sujeiras do seu Ser!
Tomara que as Pensões hoje não sejam mais assim! Tomara meu Deus!
Mas não desanime quem não tem onde morar, a Pensão é menos mal do que dormir na rua, onde será chutado feito um cachorro, e ainda tem monstros que assassinam um miserável morador de rua pelo fato deste ser profundamente infeliz.

Escuso-me por um escrito tão triste. Mas já que a demência toma conta da maioria, é necessário alfinetar as almas a fim de ver se brotam e se exteriorizam os impulsos de reflexões filosóficas presenteados pela divindade!

(Crônica de autoria de Fídias Teles)

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